sábado, 28 de maio de 2016

Ainda o Racismo

                                                                 
“Ando devagar/ porque já tive pressa/levo esse sorriso/
Porque já sofri /demais”
Almir Sater
 
Em abril de 2002 recebi uma correspondência enviada pelo gabinete da Presidência da República me convidando para instalação de um conselho da república intitulado CNPQ-Palmares,  no palácio do Planalto por FHC.- 8 conselheiros a maioria doutores e negros (uma raridade). Destinado a implantar ações afirmativas para a população negra e afrodescendente do País este conselho iniciou toda a discussão sobre cotas  ,começando pelo discurso do ex-presidente, ele mesmo um estudioso das mazelas raciais do país durante seu doutorado.Nos debates fui contra as cotas no Instituto Rio Branco do Itamarati. Explicava-se a urgência de se ter pelo menos um diplomata afrodescendente pela vergonha passada pelo Itamaraty ao enviar diplomatas brancos para a África do Sul de Mandela e sofrer reprimenda do líder africano que conhecia bem o País. e pediu para enviar um negro  que representasse 45% do extrato social brasileiro Na verdade não tínhamos. A prova do IRB é duríssima e exige estudos  de  pelo menos 2 línguas e só a elite branca tinha acesso à esta formação.  Argumentei com meus pares que minha defesa de doutorado também foi duríssima e não gostaria que tivesse sido por cotas, porque me seria retirado o mérito, e acabava de retornar de uma viagem ao exterior para defende-la .Após muitas discussões consegui convence-los a doar bolsas de estudo do CNPQ  com valores de doutorado para estudantes negros  graduados para que pudessem se preparar para o Itamarati.Um ano de pois uma médica negra como o saudoso geógrafo Milton Santos ,foi aprovada . Conto essa história para defender a minha opinião favorável às ações afirmativas em favor da comunidade negra desta nação e contra medidas paternalistas que só reforçam o preconceito contra os negros .Me lembro do prof. Milton Santos,que homenageei em vida quando diretor do Sindicato de Engenheiros do estado de SP,como a personalidade do ano de 1989.No cafezinho ele dispara :Barreto estamos fazendo a recontagem dos últimos negros na USP.Doente se referia ele à sua saída do conselho de professores titulares da maior Academia do Pais . Meses depois faleceu e pude entender: O outro negro entre os 400 era angolano naturalizado brasileiro e para  vaga de Santos foi destacado  outro branco. Numa de suas últimas entrevistas ao jornalista Roberto Dávila na rede Cultura de SP,ele,Doutor Honoris Causa nas principais Universidades do mundo,destilou amargura: Aqui no Brasil sou obrigado a estar em lugares em que os negros nunca vão e sempre me olham como se não devesse estar ali. Perfeita definição que só os afrodescendentes vencedores sabem o que  significa. O Racismo mais cruel e dissimulado do mundo. Num país que foi o último a abolir a escravatura, e olha até  hoje, pouco mais de 100anos depois ,os negros e seus descendentes como pessoas de segunda classe. Escrevo este artigo em homenagem à secretária negra barrada em uma boate  em Uberlândia e que foi à luta para denunciar este abuso ,que é apenas a ponta de um enorme iceberg social. Parabéns!
José Carlos Nunes Barreto
Professor doutor

Debatef@debatef.com

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