segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Câncer de mama: uma epidemia

 Em setembro, junto com a chegada da primavera, percebi que, paradoxalmente, um inverno se pronunciava: outra crise na saúde pública do País. E não se tratava de algo conjuntural, mas de um esgotamento do modelo de geração de riqueza, que além de excluir e gerar desigualdades de todo tipo, gera câncer. Simples: o modus operandis do ter e acumular riquezas para as 20000 famílias que mandam no Brasil(de acordo com o IPEA), não respeita limites naturais, quer sejam os ambientais ou sociais. E existe uma relação biunívoca entre câncer e poluição, câncer e degradação ambiental, câncer e grandes empreendimentos com baixa sustentabilidade sócio-ambiental. Mais uma vez fica comprovado, que a parte mais frágil da sociedade brasileira paga o preço do que Michael Lind cunhou de brazilinização: as mulheres negras e com baixa escolaridade, são as que mais morrem por não conseguirem o diagnóstico a tempo de se tratarem, em hospitais públicos, onde se leva até seis meses para se conseguir uma biópsia, e até um ano para se fazer um tratamento, isto, quando não são enganadas pela falta de equipamentos e profissionais treinados, como protesta a Sociedade Brasileira de Mastologia.
Li os tópicos principais da dissertação de mestrado sobre o assunto –“Sobrevida em cinco anos e fatores prognósticos em mulheres com câncer de mama em Santa Catarina”. Ela foi defendida pela fisioterapeuta Joyce Ceola Schneider na UFSC- Universidade Federal de Santa Catarina, e seus resultados decretam que, o diagnóstico de câncer para mulheres jovens, não brancas e analfabetas, é uma condenação de morte em até 5 anos.
Na verdade o que é comum, onde se tem uma saúde pública medianamente adequada, mesmo em países muito mais pobres que o Brasil, é tratar o tumor na sua fase inicial, ou seja, menor que 1cm e com chance em torno de 100% de cura. Ocorre que, devido às piores condições sociais das pretas, pobres e analfabetas, há falta de acesso ao diagnóstico, à informação correta e ao tratamento, pois só podem usar os hospitais públicos com suas filas intermináveis, seu despreparo técnico e de pessoal, além do comum frio descaso, com que são tratados os negros, pardos, e indígenas neste País.
 Na pesquisa de Schneider, que catalogou prontuários de 1002 mulheres com informações abrangendo 5 anos, em 2 hospitais públicos, menos de 50% delas, com idade inferior a 30 anos, sobreviveram após 5 anos.
Enquanto no mundo a mortalidade por câncer de mama está diminuindo, no Brasil ela está aumentando, reclamam os especialistas e ONGs envolvidas na ajuda a essa gente. Uma epidemia evitável se formou entre nossas jovens não brancas, e um modelo que se esgota, tira vidas preciosas que farão falta ao Brasil do futuro – aquele com uma sociedade sustentável. Enquanto isso, o INCA-Instituto Nacional do câncer, estima que só neste ano, 50 mil casos de tumores de mama vão aparecer. Um tsunami cancerígeno, portanto, que atingirá milhares de famílias brasileiras. Não adianta pensar que não é com a gente. Concluo pedindo mobilização social já! Porque talvez muito perto de você, uma estrela negra pode se apagar para sempre.

José Carlos Nunes Barreto
Professor doutor

debatef@debatef.com.br

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