No último feriado, escolhi como
releitura “A revolução dos bichos“ de George Orwel, e o que mais me chamou a
atenção, foram os dois pósfácios escritos pelo autor: o primeiro reeditando
o prefácio de 1945 endereçado à inteligência britânica e americana, o segundo de
1947, endereçado às pessoas comuns da URSS. Em 1945, a Rússia era aliada dos
ingleses e americanos contra o nazifacismo, e por isso o constrangimento foi
geral quando identificaram na fazenda dos bichos, o regime centralizador da
Rússia, e em seus dirigentes, os porcos que comandavam. Orwel em sua bela
sátira, analisa a teoria de Marx do ponto de vista dos animais, em contraponto
à dominação humana, fazendo clara alusão à experiência soviética como um todo.
Daí o choque de frente com a “real politik” ocidental, com sua elite preferindo
“acreditar” nos relatos fantasiosos que a imprensa vermelha estatal fazia dos
processos de Moscou. Esses países não quiseram “sujar as mãos” e recontar a
história mudada pela propaganda comunista, e por isso o autor, inconformado, a
transformou em uma estória de bichos, que se rebelaram contra seu dono e o
expulsaram da fazenda, assumindo eles mesmos a gestão da produção.
Escreveram sete mandamentos, e à medida
que o bonapartismo da liderança dos porcos fica claro, a lei vai sendo mudada
para favorecer os ocupantes do poder. Uma comunicação atroz, faz as ovelhas se
convencerem, que alguns bichos são mais iguais que outros, por isso “merecem”
algumas regalias. Depois, mais e mais poder centralizador, concentração de
renda, a tal ponto que os bichos de quatro patas até já estariam andando de pé,
como os homens do “ancién regime”. E suas atrocidades e expurgos até extrapolam
o que se fazia antes, e que se tornara motivo da tal revolução.
Refletindo sobre o assunto a fim de
interpreta-lo para o Brasil de hoje, relembro da revolução que nós, como os bichos
dessa estória, pensávamos que faríamos quando colocássemos o PT no poder. A
primeira mudança dos “mandamentos” veio na “Carta aos Brasileiros”, quando
descobrimos que a política econômica seria a mesma do governo anterior. Depois
de decepção em decepção, até ao mensalão e à ameaça do impeachment do porco mor
foi um pulo. Aí veio a propaganda e procurou apagar e esconder do povão os
podres do atual regime, e anão ser para os bem informados e que podem comprar
jornais, revistas e conteúdo na internet, conseguiu-se a maioria eleitoral com
a gestora do governo anterior, que embora desconhecida, surfou na onda do seu
criador-um fenômeno de comunicação de massas. Pois bem, já se foram os cem dias
do governo Dilma e o pior não aconteceu. Acho até que ela foi muito bem ao
trazer de volta a austeridade ao cargo presidencial, e trabalhar direitinho
todos os dias, dando o exemplo que faltava aos trabalhadores deste país. A
popularidade está em alta por isso, primeira mulher no governo, cuidadosa, austera,
sem estrelas que pudessem mandar mais que ela. Mas os resultados estão pífios. Seus
projetos não decolaram. O PAC aí está com seus absurdos. Como o trem bala sem
pé nem cabeça e A exemplo do que aconteceu com a elite americana e européia na
década de 40, a
nossa intelligentsia, nossa mídia, nossas sensatas lideranças, parece que já
foram cooptadas pelo carisma maligno deste Napoleão de São Bernardo, e não
estão querendo “sujar as mãos”. Por outro lado o País anseia por respostas para
questões candentes como segurança pública, saúde e educação, muito mais que
sentar no G20 da ONU, pois para pensar em liderar o mundo, precisamos primeiro
cuidar de nós mesmos, pois ao contrário da fábula, não existem homens que são
mais iguais que outros.
José Carlos Nunes Barreto
Professor doutor
debatef@debatef.com.br
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